Não me olhas. Diante da estante, deslizam os dedos por meus Rouquon-Macquart. Enquanto os livros prosseguem até o final da prateleira, os sapatos pretos gastos sujam meu assoalho de madeira polida com a poeira da rua.
-Não tinhas sapatos melhores?
Retiras um livro da estante. Um capítulo do inferno de Krtuchóvikh. Encaras fixamente a página, como querendo comê-la com os olhares entrecortados por movimentos vãos das pálpebras. No lusco-fusco, o céu incendeia e incendeia o lar do outro lado da rua.
-Escurece, pare de ler, estragas tua vista!...
Ries. Gostas do vestido? Achas que esta beleza atacará a todos? Que o discurso será imortalizado pelas paredes do anfiteatro?
Vem, aqui, mais perto, no espelho eu cintilo, como nas fotos que tanto amas. Não escondo, ao contrário de ti, nada nas prateleiras mais altas.
Mas sim, meu vestido farfalhará entre os corredores de cadeiras, eu me abaixarei, recolocarei meu enfeite na cabeça, tu o ajeitarás, e chorará lágrimas doces de emoção. E nos baterão palmas, jogarão flores, receberei lauréis e sairemos à francesa do recinto, antes da meia noite.
Chegaremos pela milésima vez na travessa K., tirarei tua gravata e tu, a minha, o porta-retrato cairá, o vidro se estilhaçará, sangrarei, tu coçarás o peito, arrependido de ter parido este ser torto e, depois de instantes, chorarei (mas tu não) desejoso de, novamente, encaixar os dedos em tuas órbitas.
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